Semana passada, em Bruxelas, o parlamento europeu iniciou discussões acerca de uma proposta de diretiva sobre gestão coletiva dos direitos autorais. Discutem-se mudanças na regulamentação da gestão coletiva dos direitos autorais e direitos conexos além do licenciamento em distintos territórios de direitos de obras musicais para uso online no mercado interno.
Na diretiva, o Parlamento Europeu está sendo representado por cinco comissões: Legal Affairs; Culture and Education; Industry, Research and Energy; Internal Market and Consumer Protection; and International Trade.
Das cinco comissões supracitadas, quatro (não-líderes) elaboraram pareceres que propõem algumas alterações ao texto da diretiva, acompanhados de justificação.
Dentre os pareceres publicados, a preocupação acerca de certas lacunas é mencionada pela Comissão de Cultura e Educação (Culture and Education):
“(…) os titulares devem ter a possibilidade de fazer suas obras disponíveis sob uma licença de conteúdo aberto de sua escolha, por exemplo sob Creative Commons, sem necessariamente optar por sair do sistema de gestão coletiva.”
“Além disso, o relator gostaria de dar ainda mais flexibilidade para os titulares de direitos na gestão dos direitos. As Organizações de Gestão Coletiva devem fornecer informações precisas sobre o repertório, em especial, para as obras que caem no domínio público; devem assegurar que as informações a respeito das obras cujo prazo de proteção termina sejam regularmente atualizadas a fim de isentar essas obras de licenciamento e evitar reclamações por parte das próprias Organizações.”
No que diz respeito às licenças abertas, a aprovação de tal proposta seria um marco na reformulação do modo pelo qual as Organizações de Gestão Coletiva tratam da autonomia dos criadores sobre as suas obras. Haveria maiores inovações no ambiente digital no que diz respeito ao crescimento e ao desenvolvimento baseados nos valores do compartilhamento e da abertura.
Já com relação ao segundo ponto, nota-se que o cerne do problema levantado diz respeito à transparência da informação sobre o repertório, que deveria ser fornecido pelas organizações de gestão coletiva.
Vale lembrar que, em 2012, o Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (ECAD) foi alvo de investigações por parte de Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Senado Federal, a qual indicou em seu relatório final práticas irregulares como abuso de direito, violação da ordem econômica e crimes diversos no exercício das atividades de arrecadação e distribuição de recursos advindos do direito autoral, conforme anteriormente comentado pela equipe do A2k Brasil.
Em consequência do exposto no relatório final, foi proposto o PLS nº 129/2012, que “dispõe sobre a Gestão Coletiva de Direitos Autorais e estabelece condições para o exercício das prerrogativas do Escritório Central cujo objetivo é a arrecadação e a distribuição dos direitos relativos à execução pública de obras musicais e literomusicais e de fonogramas” e se encontra estagnado no Senado Federal.
Espera-se que as consequências decorrentes da eventual aprovação da diretiva proposta pelo parlamento europeu, assim como a aprovação do PLS 129/2012 estejam aptas a adequar a gestão coletiva de direitos autorais aos anseios sociais, uma das áreas que mais carecem de transformações, especialmente tendo em vista os novos contingentes de criadores intelectuais advindos da internet e da tecnologia digital.
De fato, a proposta da diretiva não aborda as questões das licenças coletivas e da transparência de maneira suficiente, o que foi ressaltado inclusive em recente publicação no site COMMUNIA, ressaltando-se até mesmo a importância da gestão de direitos autorais para a digitalização de representações da herança cultural européia.
A concretização dessa proposta, cessados alguns equívocos e ambiguidades, é extremamente relevante na medida em que afirma e estimula a disponibilização de obras sob uma licença de conteúdo aberto a escolha do criador, além de conferir maior proteção, segurança e transparência aos titulares de direitos autorais e conexos. Tal mudança seria mais um passo favorável à utilização de obras intelectuais de maneira mais adequada a sua função social, assim como seria fundamental à adequação das gestões coletivas à realidade em que vivem os criadores.